Entrevista com Sidónio Bettencourt na RDP Açores

Just a Silent thought to share

19.12.12

Cor Branca





Esta saudade que grassa em minha alma
Percorre os dias, as horas, os minutos
Banha-se nas tardes de Outono, nas canções calmas
Triste, apresenta namorados, amores fortuitos
 
E na dança fugidia dos momentos
Cores incertas, a circular ao redor dos dias
São palavras, semblantes de outros sentimentos
E o passado confunde-se com o presente,
 
No intervalo das ondas e do mar
Brinca a luz, incerta e incandescente
E morre o poeta, sem nunca sentir, sem nunca amar
Esta utopia é saudade em tom real, é amor transparente
 
E nada cabe neste tempo irreal, nesta eternidade de agora
Tudo o que sabe a esta saudade é terrivelmente irremediável
É do tamanho do universo, incomensurável na sua plenitude
Triste dança, para sempre à espera de par
 
E nesta noite imortal, a saudade é amiga
Cúmplice de mim mesmo, do meu medo
Para sempre será primordialmente escondida
Lacrada dentro do meu peito
 
Morrerei assim: sem horas nem cordas
Sem aqueles toques tão teus, tristes, estão algures no tempo esquecidos
Que mesmo brancos, são horizontes longínquos, coloridos
Perdurarão nesta eternidade de nós dois
 
Um dia, um qualquer pêndulo ondulará
Soará numa qualquer parede pelo tempo desgastada
Observando almas tristes e perguntará
Quem no fim de tudo, esquecida, foi fortemente amada?
 
E responde de cor branca, na eternidade deste momento...



 JCosta

25.9.12

Lágrima nua







Aprendi a alimentar-me de dor
A suportar o amor imenso,
A deixa-lo desperdiçar no riacho do tempo
A apaga-lo sem sucesso…

Habituei-me ao sonho,
Esqueci a ilusão,
Porque a realidade do que sou
Me basta
Para que o coração
Continue ardente,
Carente,
Na busca de um nada
Que nunca terei…

Mas nesse devaneio sobrevivo,
Vivo,
Sou eu mesma,
Conhecida de mim,
De quem me desvenda,
De tantos quantos me doem,
Me beijam,
Me saciam,
De fome…

A quem me despe sem classe
Eu devolvo ao seu nada
Que é menos do que o meu...
Porque afinal eu sou tanto!
Aquele enorme quanto
Que tu desejas em secreto,
E não denuncias ao certo,
Pela dúvida
De que eu seja
Aquela que te beija
Como ninguém ousou,
Com alma,
Com suspiro e beleza,
Com a firme poção da vida...
E te convida
A uma dor eterna
De amar e amar…

16.9.12

O vinho do meu corpo




Enquanto tu, poema flamejante,

desces-me a pele vindimada,

soletras tua sede com desvario

e imprimes-me em telas de areal deitado!

Pudera eu decifrar meus balbuceios

na vertigem de uma noite descalça,

e nas pausas do teu fôlego apressado

respirar profundamente arrebatada!

Sacia-te no meu colo dilatado!

Que a tua fome se despeça lentamente

e que meus aromas sejam destilados

finalmente,

entre os teus.

3.9.12

Quem?







Quem és para que as chamas do teu nome me consumam por dentro?
Quantas folhas mais cairão em mim ateando este amor?
Quem poderá responder-me nas horas tristes,
Nas eternidades vazias em que és apenas sombra...
E nas dores que me despem de vida a cada anoitecer???
Quem me abraça sem que doa,
sem que se quebrem as minhas frágeis ilusões,
sem que se queime com o meu incenso...?
Eu viajo entre rodeios vocábulos que me seduzem
e permito-me a devaneios encurtados pelo medo,
enquanto me disto do que anseio
para que em meu seio
não poise mais um sonho
desmaiando nas minhas desilusões...

1.9.12

Pontes quebradas






Não estranhes o meu silêncio tatuado,
nem as marcas de um som rasurado,
ou as respostas vazias sem nexo!
Não estranhes o sonho desconexo
que alimento de fome e sede,
abandonado numa rede
ao relento de um tempo perdido...

Não há razão para chorar
apenas vontade de espremer
os tecidos áridos do coração,
sacudir as cinzas envelhecidas
e entulha-lo de esquecimento...

Não te admires
de eu ser a chama intensa
que esconde uma fragilidade perspicaz
sob o sedutor olhar inventado
enquanto cá dentro desmaiado
o amor corrói.

Não te espantes
com a fuga desenfreada,
nem com as palavras ressuscitadas
de um outro momento de glória
que se foi calando
ainda que na memória
seja um estandarte flácido
que define a nacionalidade
do que sinto...

Não te surpreendas
quando eu me cobrir de nuvem
deixando suspensas as pontes que te distanciam
porque enquanto não as vejo
desconfio que a dor não cresce
nem choro
porque as razões estão nubladas
pela cegueira inventada
para que eu sobreviva ainda
um dia de cada vez.

30.8.12

Sintaxe de bagos de uva







No reboliço dos teus olhares fugidios
eu sinto a efervescência de lábios em chama
apelidados de melodia
que descem a meus seios se aninhando...
As balbuciadas palavras entrançadas de suspiros
escorrem vindimadas sem rumos traçados
sem metas de êxtase...
sem luares nem sóis...
E sinto o calcar suave dos bagos doces
acariciantes amantes que me desvendam
enquanto entre os lábios me embriago
desse favo luxuriante e possessivo
vinho mel
na pele
tu...
Ah palavras de néctar espumado
que me trazes ao leito frutado
entre pétalas de rubor
timidamente gemidas
no rodopio que se avoluma,
na delicia desta bruma,
enquanto a maresia nos cobra
o suor luxuriante
delito absolvido
pela maré matinal.
Amortizados os desejos
apetites diluidos na seiva do encanto
e escreve-se o sorriso
o êxtase do agora selado
e o beijo lacra o sagrado
da pertença sem preço
num aroma raro
que apenas nós voltaremos a celebrar!

6.6.12

Seara do tempo





Debulho o tempo atrás dos montes
e junto palavras fósseis
das vozes gemidas em vida.
O sol não vinca o horizonte
que deixou de ser sorriso
nem beijo de nuvem e mar!
E declamo débil esperança
na rega lacrimal qual criança
enquanto enterro um verbo
que o mesmo tempo que se foi
lhe devoverá a alma por certo.
Basta a pureza de um gesto
porque a morte é gestacional
de um rebento virginal
tão belo quanto maior
mais eterno o amor
com que algures a promessa se cumpriu!
Partirei as vezes que for...
voltarei a sentir o sabor
desse reacender flamejante
que a eternidade garantiu
resguardar!

16.4.12

O tempo é um uniforme que teimamos querer despir, mas ele instala-se na pele resistente e teimoso... para nos ensinar que o segredo reside na forma como o cuidamos...
Por vezes nem é fácil esconder, nem é possível esquecer, tão pouco o tempo dissipar ou sequer a novidade conseguir restaurar... Nada toma o lugar que se dá porque já não é nosso.
Deixo na estante do silêncio a vaga de um momento sem cor nem som. Chama-se tempo de reflexão de onde nada brotou além de uma incógnita que já prevalecia...
Que se calem as minhas insanidades num beijo apenas, arrebatado no impulso do olhar com que sou cativada até ao âmago, mas não denunciado.
Quando não escrevo é porque o Inverno venceu-me arrancando-me a vida por inteiro, vezes sem conta... mas, quando escrevo, sinto a hemorragia dos sentidos sem que me esconda nas incertezas, porque escrever é saber ler o que se sente e por isso mesmo, sentir é viver, de vez em quando...

13.4.12

Sonho



Frágil
enquanto delirante
as águas quietas traidoras chamam por mim
E eu não caminho
vou desmaiando
sobriamente
consciente
desse pântano que me segreda...
neu sorrir está leproso,
o meu resto é poroso,
e o que sobra esvai-se em seco.
Então desço às turvas
de onde não renasço
e disto
de tudo
como sonhei.

29.3.12

Estranho



Projetado
vejo-te apenas os passos lentos pausados
enquanto se desfolha o teu perfume
como chuva de pétalas em meu rosto rosado.
Suspenso em meus cabelos
a brisa baloiça-se nas minhas pálpebras
adivinhando um véu que esconda o meu rubor...
O que te dista encurta-se,
vai encurtando...
no meu peito o ar dilata-se,
contrai-se,
perde o rumo,
suspende-se...
E tu persistes em chegar
de olhar projétil que me despe por dentro,
ávido de um suspiro suculento,
meigo e apossante
jamais como amante,
mas como mágico mudo que tudo diz num gesto.
Então eu levito
enquanto as tuas mãos me tomam
o rosto em rosa botão recém-nascido,
de polegar em lábio intumescido,
fervente,
onde os teus incendeiam finalmente.
Toque leve disfarçado, fugidio, desejado...
mãos que descem desmaiadamente,
lábios rebolantes em marés doces
como se, em volta, tudo, nada fosse...
Ah delírio, apneia, colírio, desvelo...
a perfeição de um estranho sonhado
que existe, insiste, revolve e despe o selo
de um silêncio lacrado pelo ontem perdido.
Hoje é o amanhã que ontem soube esperar,
não chega, mas vem
vêm os passos calçados, maduros e nobres,
vem a chama secreta vestida de pele,
vem a boca cerrada, magmática
de mel...
um estranho por vir
que vem
e só chega
quando eu deixar de fugir....

25.3.12

O meu bouquet



Os campos estão penteados,
Cabelos chocolate favado,
Parcelas ondulantes,
Paralelas, descendentes
Lençóis de esperança…
Sol levante, grão brotando,
Verso assobiado em bando,
Céu estrelado de asas
Coroando o natal de todas as flores!
Chegaram os perfeitos amores!
As princesas de brincos pendentes,
O chão está riscado às cores
As amendoeiras contentes…
Já dançam a valsa as rosas,
Crescem as rendas nos muros
Tingidos todos os cravos,
Beijados estão os lagos
De nenúfares navegantes…
E eu sou a que viaja e toca,
Que desliza a pele em seus veludos,
Que permite ao olhar um sonho
Que é desejo saciado
No néctar frutado
Das anteras
Daquelas gerberas
Que me fazem sorrir.

14.3.12

Mar de olhar rebelde



De tão imenso, também tu tens cadeias
Ainda assim caminhas sobre ti,
Rebolas em teus próprios lençóis,
num monólogo constante.
Teu silêncio é murmúrio de amante
é crepitar de um fogo salgado
em labaredas brancas.
Acolhes todos os sóis
e as lágrimas de todas as tempestades.
Continuas a ser tu!
Um azul rebelde e manso
de sal, adocicado,
onde se deitam todas as marés tristes
e onde acordam todos os momentos felizes.
Enquanto todos te querem
eu possuo-te
porque, não te tendo meu,
assim vais me pertencendo...
Até que eu não exista mais!

9.3.12

Há mar e amar mulher!



Há mar e amar mulher!
Desejada mulher de mar amante…
Águas violadas
De virgindade nunca perdida
Leito de batéis
Velas sem pavio
Vestes sacerdotais
De quem ensina o frio
E a carícia de uma onda menina
Sereia sem ser
Além de entrar à alma num olhar repentino
E possuir o corpo, desatino,
Destino
Predestinado
A uma ilusão sem rasto.
Apenas espuma e mastro
Num mar redondo embaciado
Pela noite que apaga os fogos
De além cinzas e azuis…

4.3.12

Querido Inverno



Hoje quero despedir-te aos pouquinhos.
Vou soprar-te as cores tristes douradas,
cobrir a tua nudez nas estradas
e beijar-te na partida suave para um sono distante...
Eu acendi um pouco mais o sol
aquele que afugentaste há dias,
que venceste com as madrugadas frias
e que hoje eu puxo para o meu horizonte...
Mas não te vais zangado!
Levas como meu legado
a saudade do leito aconchegante,
a melodia da lareira lida ao luar das velas
e o meu olhar distante
como de um romance
que não volta a ter Verão.
Pois vai-te então!
Da-me este tempo mais!
Quero passear nos teus rivais
entre o verde fresco ensolarado,
sob um sol esverdeado
salpicado de um horizonte florido.
Quero tempo para te esperar,
enquanto a pele beija o areal,
durante os trilhos de mar a meus pés,
até me esquecer como és
e desejar-te de novo aqui.
Hoje ainda não.
Amanhã e depois, e depois...
A pouco e pouco
para que eu te veja ir
sem te ver sumir
além, onde tudo converge com o meu olhar
menos eu!
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