Entrevista com Sidónio Bettencourt na RDP Açores

Just a Silent thought to share

29.3.12

Estranho



Projetado
vejo-te apenas os passos lentos pausados
enquanto se desfolha o teu perfume
como chuva de pétalas em meu rosto rosado.
Suspenso em meus cabelos
a brisa baloiça-se nas minhas pálpebras
adivinhando um véu que esconda o meu rubor...
O que te dista encurta-se,
vai encurtando...
no meu peito o ar dilata-se,
contrai-se,
perde o rumo,
suspende-se...
E tu persistes em chegar
de olhar projétil que me despe por dentro,
ávido de um suspiro suculento,
meigo e apossante
jamais como amante,
mas como mágico mudo que tudo diz num gesto.
Então eu levito
enquanto as tuas mãos me tomam
o rosto em rosa botão recém-nascido,
de polegar em lábio intumescido,
fervente,
onde os teus incendeiam finalmente.
Toque leve disfarçado, fugidio, desejado...
mãos que descem desmaiadamente,
lábios rebolantes em marés doces
como se, em volta, tudo, nada fosse...
Ah delírio, apneia, colírio, desvelo...
a perfeição de um estranho sonhado
que existe, insiste, revolve e despe o selo
de um silêncio lacrado pelo ontem perdido.
Hoje é o amanhã que ontem soube esperar,
não chega, mas vem
vêm os passos calçados, maduros e nobres,
vem a chama secreta vestida de pele,
vem a boca cerrada, magmática
de mel...
um estranho por vir
que vem
e só chega
quando eu deixar de fugir....

25.3.12

O meu bouquet



Os campos estão penteados,
Cabelos chocolate favado,
Parcelas ondulantes,
Paralelas, descendentes
Lençóis de esperança…
Sol levante, grão brotando,
Verso assobiado em bando,
Céu estrelado de asas
Coroando o natal de todas as flores!
Chegaram os perfeitos amores!
As princesas de brincos pendentes,
O chão está riscado às cores
As amendoeiras contentes…
Já dançam a valsa as rosas,
Crescem as rendas nos muros
Tingidos todos os cravos,
Beijados estão os lagos
De nenúfares navegantes…
E eu sou a que viaja e toca,
Que desliza a pele em seus veludos,
Que permite ao olhar um sonho
Que é desejo saciado
No néctar frutado
Das anteras
Daquelas gerberas
Que me fazem sorrir.

14.3.12

Mar de olhar rebelde



De tão imenso, também tu tens cadeias
Ainda assim caminhas sobre ti,
Rebolas em teus próprios lençóis,
num monólogo constante.
Teu silêncio é murmúrio de amante
é crepitar de um fogo salgado
em labaredas brancas.
Acolhes todos os sóis
e as lágrimas de todas as tempestades.
Continuas a ser tu!
Um azul rebelde e manso
de sal, adocicado,
onde se deitam todas as marés tristes
e onde acordam todos os momentos felizes.
Enquanto todos te querem
eu possuo-te
porque, não te tendo meu,
assim vais me pertencendo...
Até que eu não exista mais!

9.3.12

Há mar e amar mulher!



Há mar e amar mulher!
Desejada mulher de mar amante…
Águas violadas
De virgindade nunca perdida
Leito de batéis
Velas sem pavio
Vestes sacerdotais
De quem ensina o frio
E a carícia de uma onda menina
Sereia sem ser
Além de entrar à alma num olhar repentino
E possuir o corpo, desatino,
Destino
Predestinado
A uma ilusão sem rasto.
Apenas espuma e mastro
Num mar redondo embaciado
Pela noite que apaga os fogos
De além cinzas e azuis…

4.3.12

Querido Inverno



Hoje quero despedir-te aos pouquinhos.
Vou soprar-te as cores tristes douradas,
cobrir a tua nudez nas estradas
e beijar-te na partida suave para um sono distante...
Eu acendi um pouco mais o sol
aquele que afugentaste há dias,
que venceste com as madrugadas frias
e que hoje eu puxo para o meu horizonte...
Mas não te vais zangado!
Levas como meu legado
a saudade do leito aconchegante,
a melodia da lareira lida ao luar das velas
e o meu olhar distante
como de um romance
que não volta a ter Verão.
Pois vai-te então!
Da-me este tempo mais!
Quero passear nos teus rivais
entre o verde fresco ensolarado,
sob um sol esverdeado
salpicado de um horizonte florido.
Quero tempo para te esperar,
enquanto a pele beija o areal,
durante os trilhos de mar a meus pés,
até me esquecer como és
e desejar-te de novo aqui.
Hoje ainda não.
Amanhã e depois, e depois...
A pouco e pouco
para que eu te veja ir
sem te ver sumir
além, onde tudo converge com o meu olhar
menos eu!
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